sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

Frei Luís de Sousa, de Almeida Garrett


Esta é aquela que, segundo os críticos contemporâneos, é a obra-prima do teatro português, em si tão escasso (isto porque são poucas as obras): Frei Luís de Sousa, de Almeida Garrett. Esta obra é conhecida um pouco por todo o mundo, visto que foi traduzida na Alemanha e representada ocasionalmente.
O assunto em si é histórico: Manuel de Sousa Coutinho (1555-1632) tinha desposado a viúva de um nobre desaparecido na trágica batalha de Alcácer-Quibir; o regresso do que havia sido dado por morto destruiu a família e fez entrar os esposos em conventos.
António Arroyo focava Maria como verdadeiro centro da intriga; ela seria, por um lado, símbolo da idade de ouro moribunda, ou seja, da idade inicial quando aparecem os homens, a idade em que ainda há esperança; por outro, seria uma duplicação de Manuel de Sousa e, como tal, encarnação do seu próprio espírito.
Andrée Crabbé Rocha, que conseguiu projectar plena luz sobre a génese e o problema das origens, nomeou «quatro pontos cardeais» que, simultaneamente, seriam traços fundamentais do português: o erotismo atenuado pelo medo do inferno (pecado), as forças transcendentes, fatais e conjugadas da igreja (amparo), a honra e o brio do português (noção de pátria), e o idealismo sentimental de Maria (traço romântico).
Se olharmos da obra para a sua génese não acreditamos nos quatro impulsos ideais. E, olhando da obra para adiante, não cremos que a sua importância e influência residam nas quatro dominantes. A primeira resposta é, para ambos os lados, que a obra foi criada com estrutura de tragédia.
Na sua origem, o autor descobriu um argumento que continha «toda a simplicidade de uma fábula trágica antiga», ou seja, o próprio argumento interior já tem em si os elementos da tragédia.
Ao procurar entender a estrutura especial de tragédia desta obra, partimos da fábula. Pode reproduzir-se aproximadamente assim: uma mulher, a quem foi anunciada a morte do marido, longe da pátria, casa com um outro, que, já antes, não lhe era indiferente, deste casamento nasce uma filha. Anos volvidos regressa o primeiro marido tido por morto. O seu regresso destrói toda a família.
O tempo deste drama tem peculiaridades especiais. Com subdivisões não há nele só horas, dias e anos, mas datas e espaços de tempo estranhamente carregados. Sete anos se passam entre a morte do primeiro e o casamento com o segundo marido, duas vezes sete anos decorrem deste então. A sexta-feira é um dia especial para Madalena. O seu casamento, a fatídica batalha e o conhecimento com Manuel caem no mesmo dia do ano. É neste dia também que o primeiro marido regressa.
Concentração é a primeira característica da estrutura do tempo; caracteriza também a estruturação do espaço. O primeiro acto passa-se no palácio de Manuel, o segundo e terceiro no de D. João de Portugal.
O local da acção é formado por categorias semelhantes às do tempo, quer dizer, a partir do conhecimento.
Não temos diante de nós um drama de espaço, nem tão pouco um drama de personagens, pois estas são em número reduzido. Estão relacionadas umas com as outras de modo surpreendente e formam um todo fechado, ou seja, uma família. Compõe-se de pai, mãe, filha, e criado que é parte integrante da família. Pode quase dizer-se que a família é uma personagem, é a personagem do drama. Cada personagem tem uma adaptação às outras personagens.
Madalena vive com o seu desassossego, o seu pavor, os seus pressentimentos. Ela é constituída pelo sentimento de ter cometido um pecado, por ter amado Manuel ainda em vida do seu primeiro marido. Maria revela ser uma rapariga frágil, e esse estado precário de saúde de novo lhe dá predisposição para a morte final. Telmo faz parte da família, visto, porém, morfologicamente, ele é, ao mesmo tempo, a encarnação do passado, que, ameaçador, penetra no presente e pressagia, ominoso, um futuro fatal. Telmo e Maria estão ligados pela fé no regresso de D. Sebastião.
Manuel é quem menos parece estar construído em ordem ao acontecimento, sobretudo no princípio. Nele vão embater sem efeito os pressentimentos e receios de Madalena. O incêndio da sua própria casa quer ser um desafio aos governadores.
A despeito de tudo, também Manuel está ordenado ao acontecimento, logo desde o princípio. Os pressentimentos da mulher, na verdade, são para ele fantasias de criança.
«A catástrofe é um duplo suicídio … morreram para o mundo», esta é a forma e catástrofe no Frei Luís de Sousa. É um extermínio completo. Desaparece uma família inteira.


Raquel

quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

Ironia Trágica

O conceito de ironia trágica pressupõe a convicção de que sem ironia não há tragédia. Este conceito remonta à obra de Connop Thirlwall, "On the irony of Sophocles" na qual ele defende a existência de dois níveis de ironia na tragédia. O primeiro desses níveis é o que ele chama de “ironia da acção (trágica)” e o segundo de “ironia do poeta (trágico)”.
A ironia da acção trágica é o que permite diferenciar a ideia de destino propriamente trágica da ideia de destino presente nos mitos que a tragédia toma como matéria-prima. Enquanto nos mitos o destino aparece como uma espécie de necessidade cega, de violência em estado bruto que arrasta gratuitamente o herói, apresentado como marionete dos deuses, na tragédia não há tal passividade. A queda do herói, para ser trágica, precisa em alguma medida de ser auto-infligida. A ironia da acção trágica, como bem mostrou Peter Szondi no seu ensaio sobre Édipo Rei, repousa sobre “a unidade de salvação e destruição. A destruição em si não é trágica, mas sim o facto de que a salvação vire destruição. O trágico não se consuma com a queda do herói, mas sim com o facto de o homem naufragar no caminho que tomou justamente para escapar ao naufrágio”. Essa é, aliás, uma possível interpretação do que Aristóteles chama de Peripécia.

André
Talking Heads
Once in a lifetime (para os meus amigos do 11D)

segunda-feira, 2 de fevereiro de 2009

Casamento Intercultural

Hoje em dia, a sociedade que nos envolve, faz-nos cada vez mais questionar acerca de temas cuja resposta muitas vezes não nos interessa ou nos exige demasiado. O Cardeal Patriarca de Lisboa D. José Policarpo abordou o tema do casamento entre duas pessoas, em que um dos conjuges é de origem muçulmana. Na sua opinião, este género de uniões poder-se-á um problema consistente, apesar da sua evidência. A cultura muçulmana é muito peculiar, com particularidades e hábitos aos quais nem todos se sujeitariam. Por isto, D. José Policarpo avisou: 'Cautela com os amores. Pensem duas vezes em casar com um muçulmano, pensem, pensem muito seriamente, é meterem-se num monte de sarilhos que nem Alá sabe onde é que acabam.' A comunicação é e sempre foi um problema, uma vez que os muçulmanos acreditam que a sua verdade é única e incondicional. No entanto, para que haja pelo menos uma tentativa de comunicação com este povo é necessário uma “primeira atitude fundamental”, respeito e conhecimento.
Voltando à problemática do casamento intercultural com um indivíduo de raça muçulmana, seja homem ou mulher, seria cliché e muito bonito de se dizer que o amor prevalece à cultura, às dificuldades, às divergências, etc. No entanto, trata-se de um problema mais complexo, uma vez que é muito complicada a adaptação a esta cultura extremamente opressora, não havendo outra alternativa nesta situação. No caso do casamento com um muçulmano, este poderá fazê-lo fora da sua religião e cultura já a mulher muçulmana não. O discurso do nosso Cardeal, a meu ver, foi um justo conselho de realismo e não uma discriminação, apesar da falta de eloquência e ponderação com que D. José Policarpo proferiu o seu discurso. No entanto, se fizermos uma análise geral, poderemos aperceber-nos de que as palavras do Cardeal de Lisboa têm o seu sentido, sendo que, por exemplo, uma mulher que case com um homem muçulmano terá de mudar para sempre todo o seu conceito de “liberdade”, viverá escondida numa burca, nunca poderá andar na rua sem ser acompanhada, terá de ficar em casa a cuidar da família, sem se pôr a si própria a hipótese de uma vida profissional, etc. Será que o amor prevalece à liberdade? Na minha opinião isto não é amor por alguém mas sim falta de amor-próprio. Ninguém deveria pôr em risco a sua liberdade, os seus costumes, os seus ideais e as suas ideologias por um casamento opressor com costumes extremistas e retrógrados. Isto não é amor, é uma sentença de morte.


Marina
A mudança de atitude de Telmo na Cena IV do acto III,
Frei Luís de Sousa

No início da peça podemos constatar que Telmo era o homem de confiança de D. João de Portugal. Condena D. Madalena por ter casado com D. Manuel, mesmo sem ter certezas de que D. João estaria morto e toda a sua lealdade dirigia-se para D. João.
Quando D. Manuel incendiou a sua casa para fugir aos inimigos, Telmo começou a admirá-lo, pois achou que o acto de D. Manuel era puro patriotismo e considerou-o um verdadeiro português.
A partir desde momento, Telmo começou a ser fiel ao seu novo amo, D. Manuel, e deixou de julgar D. Madalena.
No seu monólogo, Telmo faz uma espécie de reflexão sobre a sua vida, ou seja, uma espécie de hybris. Mas, em vez de ser uma revolta interior, é mais uma reflexão e conclusão que Telmo faz da sua vida e de tudo o que se tinha passado com ele. Diz que se afeiçoou bastante a Maria e que já não a via como filha ilegítima ou como filha do pecado. Podemos reparar que nas palavras de Telmo existe um certo sentimento de culpa por não ter acreditado na possibilidade de D. João estar vivo. Pede desculpa por não ter acreditado e ainda refere que a aproximação entre ele e Maria não é pecado, pois considera-a com um anjo.


Raquel

terça-feira, 27 de janeiro de 2009

Palavras de Telmo
O que está de acordo com o que já conhecemos dele e o que não está de acordo


No início da peça, Telmo mostra-se fiel ao seu primeiro amo, D. João de Portugal. Até condena Madalena por se ter casado com D. Manuel sem saber, com toda a certeza, se o seu primeiro marido estava morto ou não.
Ao longo da peça, pode notar-se uma mudança nessa lealdade prestada por Telmo.
Após o acto de D. Manuel de incendiar a sua própria casa para fugir aos inimigos, nasceu em Telmo um novo respeito pelo seu novo amo. Chama-lhe “verdadeiro português” e um “português às direitas”, ou seja, admira-o pelo seu patriotismo e amor ao seu país.
Nesta cena, a IV do acto III, é apresentado um monólogo de Telmo. Uma reflexão feita pelo mesmo. É quase uma confissão.
Telmo admite que sente mais amor e que, naquele momento, mais lealdade por Maria do que pelo seu antigo amo, D. João. Telmo está também preocupado porque Maria é filha do pecado e tem medo que Deus a leve.
Este momento representa a revolta interior de Telmo, ou seja, está retratado um momento da tragédia, a hybris. Ou seja, é o momento em que Telmo diz a verdade, a sua própria verdade e o que sente. E mais que uma revolta, é uma reflexão sobre a situação e sobre a sua própria vida.
Neste monólogo, quase que se lê nas entrelinhas que Telmo desejava que D. João estivesse morto para poder continuar com a sua vida normal, a cuidar de Maria. A dedicar todo o seu tempo à sua nova “filha”.
É de facto uma grande mudança da opinião e sentimentos de Telmo em relação a D. João, D. Manuel e Maria. O que começa por ser uma grande admiração por D. João, passa, no final da peça, a uma substituição dessa admiração, adoração e lealdade para Maria e para a sua família. Telmo nunca viu Maria como um pecado ou o resultado de um, viu-a sempre com um anjo. Um anjo que não tinha culpa do que tinha acontecido, da morte de D. João, do segundo casamento de D. Madalena e de não se saber se D. João estava morto ou não. E, muito menos, de D. João ter voltado. Telmo nunca a olharia com outros olhos porque a ama tanto como a uma filha e nunca a veria como ilegítima.


Ana Rita
Texto Argumentativo a propósito das palavras do Cardeal Patriarca de Lisboa

O Cardeal Patriarca de Lisboa surpreendeu, na noite de terça-feira, o auditório do Casino da Figueira da Foz, ao deixar um conselho às jovens portuguesas, quanto a eventuais relações amorosas com muçulmanos, afirmando: "Cautela com os amores. Pensem duas vezes em casar com um muçulmano, pensem muito seriamente, é meter-se num monte de sarilhos que nem Alá sabe onde é que acabam."
Relativamente ao que o Cardeal Patriarca de Lisboa disse, concordo, pois uma mulher católica, ao casar-se com um homem muçulmano, terá de acarretar com todos os princípios dessa religião, conhecidos por não lhe darem liberdade, e por passar a estar dependente do marido.
Acho que o que o Cardeal Patriarca está certo no que diz. É preciso que a mulher, antes de se apaixonar, conheça todas as responsabilidades que isso traz. É uma viragem na vida da mulher.
Na minha opinião, acho também que o Cardeal Patriarca não pode dizer isso em público, numa conferência, como representante da Igreja Católica, visto que virá a ser mal entendido pela religião muçulmana, e é importante uma boa relação entre todas as religiões. Contudo, acho que não foi por mal, foi apenas um desabafo que, no fundo, não está em desacordo com o que a maioria de nós pensa sobre o papel da mulher na religião muçulmana.

Mariana
PATHOS

Do grego pathos, paixão. Qualidade na fala, em escritos, acontecimentos ou outros, que excita a piedade ou a tristeza; consequências terríveis do descomedimento humano, sugerindo no espectador da tragédia o temor religioso ou a sua simpatia, dependendo, desta forma, das intenções e da concepção filosófica do autor da tragédia.


João Gaspar
No decorrer da aula de Português, abordámos um pouco o tema da multiracialidade devido ao comentário do Cardeal Patriarca de Lisboa, D. José da Cruz Policarpo, em que este referia a ideia de que um crente cristão não deveria criar laços matrimoniais com crentes de outras religiões (referindo-se no seu comentário a crentes muçulmanos).
Acerca deste comentário, na minha opinião racista, penso que o Cardeal Patriarca de Lisboa está a ter uma atitude incorrecta, ficando preso a preconceitos acerca de uma religião maioritária e dominante (neste caso a cristã) que não poderá criar relações amorosas com fiéis de outras religiões. Primeiro que tudo, o amor, sentido por dois seres, não deve ter barreiras preconceituosas como estas, devendo antes permitir sempre a interligação mútua entre os dois, sem fronteiras, pois o amor não escolhe cores, religiões ou outros, mas simplesmente escolhe o outro. De acordo com a minha opinião pessoal, concordo com a possibilidade de existir um amor entre diferentes pessoas de diferentes religiões, pois penso que um casal de diferentes religiões não vai mudar de crenças só porque o seu parceiro de vida pensa de maneira diferente, acerca de uma crença religiosa que tem e, portanto, penso que o amor é amar o próximo da maneira como este é e foi, não de uma maneira ideal de como se pensa que este venha a ser e, portanto, quando se ama, respeita-se as escolhas dos outros, não mudando de maneira alguma a forma e quantidade de amor que existe entre um e outro.
Apesar de não concordar com muitas maneiras existentes hoje em dia de amar, uma coisa é certa, este tipo de amor (um amor entre religiões) não tem nada que o impeça de existir. Apenas os preconceitos podem arruinar a existência deste amor. Muitas vezes também pensamos de onde surge esta quantidade significante de preconceitos e, após reflectirmos um pouco, podemos entender que surge do livro mais publicado de sempre: A Bíblia. Este é o livro da religião cristã (a religião com mais seguidores à face da terra) e o que impôs a maioria dos preconceitos existentes na sociedade de hoje em dia, embora esta sociedade actual esteja um pouco mais actualizada.
Em conclusão, penso que a existência deste amor entre diferentes religiões é sempre possível se existir de verdade e penso também que se esta existência for mesmo real e pura não existirá qualquer barreira que o possa impedir.


João Gaspar
No monólogo de Telmo podemos reparar que este se afeiçoou demasiado a Maria, deixando, assim, de ser totalmente leal a D. João de Portugal, presumivelmente morto na batalha de Alcácer-Quibir. Nesta fala pode reparar-se que Telmo, apesar de desejar e de ter sonhado durante bastante tempo, esperando o regresso de seu amo, D. João, nesta altura não consegue deixar Maria, filha ilegítima de D. Madalena e de D. Manuel.
Nesta altura da peça, podemos reparar numa mudança extrema de atitude de Telmo, pois, devido a um excessivo afeiçoamento para com Maria, ele “esqueceu-se” da sua lealdade para com D. João, o que o torna “livre”, na medida em que deixa de ser para sempre o aio de D. João. Assim, nas suas palavras, pode reparar-se num sentimento de culpa por não ter acreditado até aos últimos dias que o seu aio estava vivo. Por isso pede desculpa pelo pecado cometido e, depois, também volta a referir que não há hipótese de haver pecado por se aproximar de “um anjo”, Maria, a filha ilegítima de D. Manuel e D. Madalena .


João Gaspar
O Cardeal Patriarca de Lisboa alertou as jovens portuguesas para a possibilidade de o casamento com um muçulmano acarretar um “monte de sarilhos”, devido ao fosso entre as duas culturas. D. José Policarpo admite que a comunidade cristã é muito ignorante em relação à muçulmana, sendo o conhecimento o primeiro passo para um diálogo, que classifica de “muito difícil”. A comunidade islâmica não comenta, para já, as declarações do Cardeal.
Na minha opinião, estas palavras do Cardeal Patriarca de Lisboa não apelam àquilo que é um dos princípios da igreja, o casamento, entendido como uma união, através da qual as pessoas se juntam por várias razões, mas normalmente para dar visibilidade à sua relação afectiva, para buscar estabilidade económica e social, para formar família, procriar e educar os seus filhos, legitimar o relacionamento sexual ou para obter direitos como nacionalidade. Logo, acho que o casamento entre pessoas de etnias diferentes não deveria ser tabu ou problema.


Madalena
Acto III
Cena IV
Mudança de Telmo:

Telmo era o homem de confiança de D. João de Portugal e reprovava o casamento de D.Madalena com Manuel de Sousa Coutinho, pois, na sua óptica, o homem que merecia todo o respeito era D.João.
Entretanto, há vários factos que provocam a mudança em Telmo:
- o reconhecimento pelo carácter de grande patriota que não hesita em deitar fogo à sua casa para mostrar aos governadores castelhanos que, para ele, rei só havia um: Português (estamos a falar de Manuel de Sousa Coutinho);
- a vivência ao lado de Maria, vê-la a crescer e desenvolverem-se nela dotes admiráveis que despertam nele, no velho Telmo, o seu coração de homem sensível quase como um avô que acompanha dia-a-dia aquela menina em fase de crescimento e ele adora-a, ajuda a educá-la, conta-lhe histórias e, a cada dia que passa, vai ficando cada vez mais preso a Maria.
Com estes dois grandes factos não admira que haja uma mudança em Telmo, relativamente a Manuel de Sousa Coutinho a quem agora admira e compreende. Relativamente àquela menina que vê crescer dia a dia e a quem ele ama, recusa-se a pensar que ela pode sofrer com o afastamento dos pais e prefere ficar do lado dela em vez do lado do seu antigo rei, D.João de Portugal.
Quando fala com D. João, nota-se essa mudança, ele explica-lhe que na sua ausência, ou seja naqueles 14 anos tinha nascido uma menina inocente e que merecia ser feliz, não castigada pelo destino, pelo seu regresso e toma uma posição que, outrora nem em causa punha.


Ana Patacão
A mudança ocorrida em Telmo Pais

Telmo Pais era o antigo aio e amigo escudeiro de D. João de Portugal e tinha um enorme amor, dedicação e fidelidade por este. Depois da “morte” de D. João, e passados cerca de sete anos, D. Madalena volta a casar, desta vez com Manuel de Sousa Coutinho: estes eram os "patrões" actuais do escudeiro Telmo e, além disso, este era considerado um amigo muito próximo ou mesmo parente da família.
Apesar de todos acharem que D. João tinha morrido, Telmo mantinha-se firme, pois acreditava que o seu senhor continuava vivo. Telmo não aceitava muito bem o facto de D. Madalena ter recomeçado a sua vida e de ter casado pela segunda vez: era uma prova de que D. João de Portugal podia ser superado ou ultrapassado. E isto era algo que Telmo pensava nunca conseguir: construir a sua vida sem a presença de D. João. Apesar de D. Manual de Sousa Coutinho ser um honrado e gentil cavalheiro, nunca conseguiria atingir o estatuto que D. João tivera para o próprio Telmo.
Deste segundo casamento resultou uma única filha, D. Maria de Noronha. No princípio, quando esta ainda era criança, Telmo não conseguia sentir um grande afecto por ela, pois sentia que D. Maria tinha nascido de uma traição, mas, à medida que esta foi crescendo, Telmo foi descobrindo um anjo dentro dela, repleto de bondade e de formosura. Numa das passagens iniciais, Telmo mostra o pouco apreço que tem pela situação em que D. Maria se encontra, já que esta era “digna de nascer em melhor estado”.
D. Madalena tem um enorme respeito e amizade para com Telmo, pois foi sempre admirando cada vez mais a sua pessoa e colocou-o numa posição bastante elevada na sua vida. Quando o seu primeiro marido morreu, D. Madalena apoiou-se em Telmo, que lhe dedicou todo o carinho e afecto que tinha para dar.
Telmo, sem se aperceber, foi transferindo o amor e admiração que tinha por D. João para D. Maria. Só no final na peça é que Telmo percebe que também tinha mudado, e que agora era D. Maria a sua senhora. Foi este o processo que se desenrolou ao longo da peça: por um lado, uma descoberta de si próprio, que só se concretizou no final da peça, e por outro lado a mudança que se instalara sem Telmo sem este se aperceber. Quando, no final da peça, é provada a crença de que D. João de Portugal estava vivo, Telmo também se apercebe que já não era o mesmo homem. Dá-se na cena IV do terceiro acto uma confissão marcada pelo sentimentalismo por parte de Telmo, quando este expõe a sua confusão interior. Nesta cena, a mudança de Telmo torna-se evidente e clara aos seus próprios olhos: o amor por D. Maria ultrapassara e apagara aquele que fora sentido por D. João. Durante todos esses anos, Telmo esperou pacientemente pela vinda do seu senhor, acreditando que era esse o desejo. Esperou tanto e desejou o seu regresso de uma forma tal que não conseguiu distinguir se era realmente isso que queria. Tinha-se habituado a essa espera, sem nunca reflectir e entender que era D. Maria que o preenchia. Dá-se então uma morte psicológica do antigo Telmo. Na cena V, Telmo assume uma nova posição perante a sua realidade: é chamado a admitir a D. João de Portugal, seu bom senhor e amigo, os novos sentimentos que se manifestavam e que se elevavam a quaisquer outros.


Marta Serra

quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

O Comportamento de Telmo na Cena IV do acto III,
de Frei Luís de Sousa

Ao longo da peça, Telmo Pais comporta-se sempre de uma forma leal para com D. Madalena e Manuel de Sousa, recordando com lealdade o seu antigo amo, D. João de Portugal.
Na cena IV do acto III, Telmo muda de atitude.
No início do seu discurso, o escudeiro mantém e relembra a lealdade de sempre para com D. João de Portugal, acreditando que um dia ele iria voltar da batalha de Alcácer-Quibir, de onde desaparecera 20 anos antes.
“Meu honrado amo, o filho do meu nobre senhor está vivo… o filho que eu criei nestes braços… vou saber novas certas dele – no fim de vinte anos de o julgarem todos perdido – e eu, eu que sempre esperei, que sempre suspirei pela sua vinda…”
No entanto, Telmo apercebe-se que era um milagre que ele esperava sem o crer. Telmo sente-se dividido entre a lealdade que tem para com D. João de Portugal e a afeição por Maria, pede mesmo a Deus que o leve. Toda a sua lealdade pertence agora a Maria “… é que o amor desta outra filha, desta última filha, é maior, e venceu… apagou o outro”.
Telmo, que ao longo de 20 anos tinha ansiado pelo regresso de D. João de Portugal, apercebeu-se de que não queria realmente a sua vinda, pois esta iria acrescentar ainda mais sofrimento a Maria. O regresso de D. João vai ser uma fatalidade para toda aquela família. Pede a Deus que o leve e que poupe a vida a Maria, dando-lhe mais algum tempo de vida.

João Figueiredo
Na minha opinião, o Cardeal Patriarca de Lisboa, D.José Policarpo, não foi muito correcto ao dizer que as mulheres deviam pensar muito bem antes de casarem com muçulmanos.
Eu não concordo com o Cardeal, porque penso que ele está a contribuir para a desunião das pessoas. Por muitos conflitos religiosos que uma cristã e um muçulmano possam vir a ter, acho que não é motivo suficiente para impedir um casamento.
Penso que o que o Cardeal quis dizer é que as mulheres portuguesas se deviam informar e conviver com a religião muçulmana antes de se casarem com um muçulmano. No entanto, pareceu transmitir a mensagem que o casamento entre uma cristã e um muçulmano só gera conflitos.
Percebo o motivo da polémica gerada em torno da sua afirmação, e acho que o Cardeal vai passar a ter mais cuidado ao abordar assuntos como este.

João Figueiredo
“Cautela com os amores. Pensem duas vezes antes de casarem com um muçulmano, pensem, pensem muito seriamente, é meterem-se num monte de sarilhos que nem Alá sabe onde é que acabam.”?
É a coisa mais racista que alguma vez ouvi, mas, ao mesmo tempo compreensível. Sim, porque as pessoas têm um certo hábito de julgar em vez de perceber. Preferem ir pelo caminho mais fácil e discriminar do que ir pelo mais difícil e perceber o que é diferente.
Penso que as palavras do Cardeal Patriarca de Lisboa fazem sentido para algumas pessoas, pois estamos inseridos numa sociedade que ainda não está totalmente evoluída em relação às outras culturas. Inicialmente, era um escândalo, uma jovem de cor branca envolver-se com um rapaz de origens africanas. Era uma afronta à dignidade portuguesa. Mas, sinceramente, nunca percebi o porquê destas opiniões, pois as relações com o nosso país e o continente africano já vêm escritas na História de Portugal.
Hoje em dia, um casamento entre pessoas de origens portuguesas e africanas já não é um tabu da nossa sociedade porque, ao longo do tempo, as pessoas tentaram entender e aceitar as pequenas diferenças existentes.
Acho que as diferenças entre a cultura portuguesa e a muçulmana também poderão ser ultrapassadas pois a mente das pessoas está em constante evolução. Não será, certamente, por estar escrito que um homem muçulmano tem de ser o ‘dono’ da sua mulher ou de mais, que as próximas gerações que se fixem em Portugal pensem assim.

Raquel
Os recentes comentários do Cardeal Patriarca de Lisboa, D. José Policarpo, foram um tanto ou quanto exagerados, embora os considere relativos, visto que o casamento é um compromisso para ser levado para toda a vida e acredito que qualquer pessoa deva pensar, não só duas, mas inúmeras vezes antes de avançar com a decisão de se casar ou não com outra pessoa, seja ela seguidora ou não de uma religião.
Mas, parece-me impossível que as palavras de D. José Policarpo sejam interpretadas a partir desse ponto de vista, já que, na minha opinião, foi bastante ofensivo da sua parte ‘’prevenir’’ as jovens portuguesas do ‘’monte de sarilhos’’, palavras suas, em que se envolveriam caso viessem a casar com um muçulmano, fazendo referência, ainda, ao deus da religião Islâmica, Alá.
Sendo assim, considero hipócrita da parte de um dos representantes dos cristãos católicos em Portugal, defender que seja necessário ‘’respeito e conhecimento’’ em relação à religião em questão e ainda audacioso, da parte do mesmo, requerer diálogo com a comunidade muçulmana quando o próprio se coloca numa posição opositora à miscigenação entre as culturas, tornando, assim, a mágoa sentida pelos muçulmanos bastante compreensível.
Particularmente, defendo que o amor se sobreponha a qualquer questão de natureza religiosa e que, se as pessoas se amam e partilham o desejo de viverem até ao fim das suas vidas ao lado uma da outra, devem fazê-lo independentemente disso.

Ana Carolina
Embora não tenha ouvido o Cardeal Patriarca de Lisboa a alertar as portuguesas para os riscos dos casamentos com muçulmanos, li a notícia do jornal «Público» que relatava esse assunto.
A notícia mostrava algumas frases ditas pelo Cardeal como “o monte de sarilhos que iriam arranjar ao casar com muçulmanos, que nem Ala sabe onde acabam”. Na minha opinião, o que o Cardeal quis dizer com esta frase é que as mulheres que se casam com os muçulmanos ficam metidas em tamanhos problemas que nem Alá, o seu Deus, saberá acabar com eles. Dando um exemplo real, para dar uma maior credibilidade ao seu discurso, ao alegar que uma jovem francesa de educação cristã quando foi para “o país deles” foi obrigada a cumprir o regime das mulheres muçulmanas. O Cardeal acrescentou ainda que o diálogo com os muçulmanos em Portugal é muito difícil, visto que eles estão sempre a tentar converter os católicos à sua religião.
A meu ver, o Cardeal Patriarca fez uma generalização apressada com o caso da jovem francesa. Para além disso, penso que está a discriminar a comunidade muçulmana, o que é mais fácil do que compreender porque é que tem determinados comportamentos, dando origem a confrontos culturais, por vezes demasiado fortes.
O Islão é a segunda religião com mais fiéis no mundo, onde o número de crentes tem vindo a crescer mais do que em qualquer outra. Existem cerca de 1, 3 biliões, no entanto, apenas 18% vive no mundo árabe. Em Portugal estima-se que existam 30 mil muçulmanos e, segundo o Cardeal Patriarca de Lisbao, é muito difícil falar com eles. Agora eu pergunto como é que Portugal pode então viver pacificamente?
O islamismo reconhece elementos de verdade no judaísmo e no cristianismo. Todos os profetas do judaísmo são reconhecidos também como profetas no Islão, assim como Jesus Cristo, que de acordo com a perspectiva muçulmana teria anunciado a vinda de Maomé. Para os seguidores destas duas crenças o Corão reservou a noção de “Povos do Livro”estabelecendo que devem ser tolerados devido ao facto de possuírem escrituras sagradas. À medida que os muçulmanos tomaram contacto com outras religiões detentoras de revelações escritas, acabaram em alguns casos por conceder-lhes também esse estatuto.
Porém, se o Islão reconhece o papel preparatório do judaísmo e do cristianismo, considera igualmente que os seguidores destas religiões acabaram por seguir caminhos errados. Os judeus procederam mal ao adorarem o bezerro de ouro, tendo-se tornado idólatras, enquanto que os cristãos erraram ao considerar Jesus filho de Deus e a defender doutrinas como a da Santíssima Trindade.
O Islão é também uma religião onde não há uma autoridade oficial que decide se uma pessoa é aceite ou excluída da comunidade de crentes. O Islão é aberto a todos, independentemente de raça, idade, género, ou crenças prévias. É suficiente acreditar na doutrina central do islamismo, acto formalizado pela recitação da chahada, o enunciado de crença do Islão, sem o qual uma pessoa não pode ser considerada um muçulmano. Sendo assim, na minha opinião, quem entra deverá sair com a mesma facilidade, portanto, as mulheres que se casam com muçulmanos, se estão insatisfeitas, deverão sair de igual forma, não competindo ao Cardeal alertá-las sobre tal.

Ana Margarida
As palavras de D. José Policarpo, Cardeal de Lisboa, proferidas na noite de terça-feira, dia 13, foram severamente atacadas por parte dos indivíduos e das instituições. As suas declarações de que as mulheres europeias “têm de ter cautela com os amores com muçulmanos” e que devem “pensar duas vezes antes de casarem com um muçulmano” foram criticadas e interpretadas de uma forma incorrecta por parte da comunicação social.
Escusado será dizer que concordo com as suas palavras, pelo facto de ser tão óbvia esta realidade. Temos de ser realistas: qual é o grau de abertura e de iniciativa no diálogo dos muçulmanos para com as outras religiões? Será por acaso que não existem Igrejas Católicas em Meca enquanto que existem mesquitas em Itália, sede de todo o Cristianismo? E mesmo em Portugal, a Igreja Católica mantém uma relação saudável e de tolerância para com os muçulmanos no país, embora estes estejam pouco abertos ao diálogo. Como o Cardeal disse, “só é possível dialogar com quem quer dialogar”. Não há dúvidas de que para poder existir diálogo inter-cultural é preciso estar na disponibilidade de conhecer e de se dar a conhecer às outras culturas ou religiões, simplesmente porque não as conhecemos nem as outras nos conhecem. O conhecimento do outro e a sua compreensão é o primeiro passo para o diálogo, e portanto, sendo a religião muçulmana fechada em si mesma, não deixa espaço senão para a profunda separação entre religiões. O diálogo é a única ponte que as pode ligar.
Nós não podemos ignorar o peso que as nossas diferenças culturais têm na relação uns com os outros, porque estas existem, apesar de todo o esforço para deixar isso de lado. Isto não se trata de preconceito ou de intolerância, mas sim de realismo.
Vivemos numa sociedade que pretende cultivar o diálogo inter-cultural e religioso, como sinal da evolução de mentalidades, mas temos de reconhecer que ainda não é isso que se colhe. Queremos chegar lá, mas enquanto as religiões não comunicarem, temos de ter consciência das dificuldades que existem nas relações entre pessoas de diferentes religiões e não podemos ignorá-las. Além do mais, existem casamentos entre mulheres europeias e homens muçulmanos que são a prova viva de que o matrimónio pode perdurar, e outros ainda que acabam de formas terríveis, o que não contradiz a observação que foi feita: “é preciso ter cuidado”, não é preciso evitar.
Na religião muçulmana, a mulher é inferiorizada, é submetida em tudo ao marido e perde tanto as suas liberdades como muitos dos seus direitos. Trata-se de factos reais que justificam o conselho do Cardeal, mas que não impedem o seu relacionamento e que não incentivam de modo algum nem à intolerância, nem à discriminação. As pessoas são livres de fazerem o que acharem melhor, e embora pensem que Dom José Policarpo acaba por atacar os muçulmanos e de se colocar contra eles, este apenas está a favor da mulher e da sua liberdade. A verdade é que esta é mais uma pedra que se pode atirar à Igreja, esta que “continua a viver na antiguidade” e que “não está disposta a acompanhar a evolução da sociedade”. E isto percebe-se, uma vez que a Igreja não pode evoluir ao ponto de aceitar ideais que vão contra os seus princípios. Mas criticar a religião católica e dizer que esta mostra discriminação perante outras religiões, é esquecer uma das suas principais missões.
As mulheres devem, portanto, pensar muito bem antes de casarem com um muçulmano, porque estarão a sujeitar-se a regras rigorosas e intransigentes que não levam de nenhum modo a uma maior tolerância ou respeito entre indivíduos com crenças diferentes.

Marta Serra
No passado dia treze de Janeiro o Cardeal Patriarca de Lisboa, D.José Policarpo, alegou que o casamento de uma cristã com um muçulmano poderia conduzir a «um monte de sarilhos», falando na tertúlia “125 minutos com Fátima Campos Ferreira”, que decorreu no casino da Figueira da Foz.
O Cardeal deixou um conselho às jovens portuguesas que estão para casar para repensarem nos seus relacionamentos com muçulmanos.
Na minha opinião, tratou-se uma intervenção bastante infeliz por parte de alguém que exerce tamanha força na nossa sociedade. Quando são feitos, estes comentários não podem fazer transparecer a opinião pessoal, mas sim a da instituição a que se pertence.
O papel da Igreja não pode passar nunca por criar conflitos, discriminações ou qualquer outra coisa que possa ter passado pela cabeça das milhares de pessoas que tomaram conhecimento desta intervenção.
A realidade é que este conselho vai ser tomado à risca por muitas pessoas que acreditam e nunca poriam em questão uma única palavra vinda da Igreja. Alegações como as que o Cardeal fez, podem ser mal interpretadas e desencadear uma série de conflitos, pois, ao falar desta forma, misturaram-se assuntos complicados, como a Guerra de Religiões.
A verdade é conhecida e cada vez mais divulgada pelas próprias vítimas praticantes da religião muçulmana. Não é fácil muitas vezes viverem com regras tão dolorosas e rigorosas como as impostas pela religião muçulmana. As mulheres acabam por viver sob as ordens dos homens. É como se, a partir do momento em que a cerimónia se realiza, a mulher passasse a ser propriedade do homem.
Apesar de muitas das regras impostas não fazerem sequer parte dos direitos humanos, e de eu não concordar com as condições a que estas mulheres são submetidas somos obrigados a aceitar e acima de tudo a respeitar.
Quando uma mulher católica casa com um muçulmano e admite que lhe sejam impostas estas regras não tem direito de acusar ninguém, pois, a partir do momento em que fez esta união, comprometeu-se com a religião e com a sua nova família.
Mas não podemos rotular os muçulmanos dizendo que todos eles tratam mal as mulheres, não é correcto. Do mesmo modo, não é correcto afirmar-se que um homem, só porque é português, vai violentar a sua mulher. Não é pelo facto de a violência doméstica ter um valor menor que possa vir a ser generalizada em todas as casas de família.
Assim, não é a nacionalidade ou a religião que vão descrever a vida de uma pessoa, ou prever o seu futuro.
Mas, apesar de tudo, acredito que, apesar de infeliz a intervenção do Cardeal Patriarca, não foi de mau grado, porque, no fundo, penso que ele, ao dizer isto não impôs nada a ninguém. A sua intervenção foi um alerta, querendo chamar a atenção para os problemas com os dois sistemas de casamento e de tratamento que são muito diferentes, podendo provocar um choque cultural.
Mas reforço que o discurso não foi bem sucedido, até porque o Cardeal já conhece bem este meio e sabe que as suas palavras acabaram e acabarão por ser interpretadas de uma outra forma, atacando a Igreja católica, pois é a instituição que D.José Policarpo representa.

Mafalda Monteiro
As palavras do Cardeal Patriarca de Lisboa, D. José Policarpo, geraram polémica e controvérsia. Disse que as mulheres cristãs devem pensar muito bem e mais que uma vez se forem casar com homens muçulmanos. Disse também que a opressão feita por esta cultura às mulheres é testemunhada por várias mulheres, ou seja, que já houve casos destes – casamentos entre mulheres cristãs e homens muçulmanos, que não correram bem. Pelo menos, segundo as suas palavras.
Em primeiro lugar, acho que todas as mulheres devem pensar duas vezes antes de casar, seja o noivo muçulmano, cristão ou de qualquer outra religião. O suposto do casamento é ser eterno, e ambos têm de ter a certeza do que estão a fazer e porque o estão a fazer.
Em relação às palavras do Cardeal, concordo apenas com o facto de se ter de pensar mais que uma vez quando as raparigas se vão casar. É verdade que alguns muçulmanos oprimem e subjugam as mulheres, mas não é a religião. No seu livro sagrado, o Corão, não está escrito que se deva oprimir as mulheres e tratá-las com desigualdade, muito pelo contrário.
O curioso no discurso do Cardeal Patriarca de Lisboa é o facto de não referir o caso contrário, ou seja, homens cristãos casarem com mulheres muçulmanas. A pergunta que impera é então: os homens não precisam de pensar quando vão casar? Pelas palavras do mesmo, parece que não.
Então, já é aceitável os homens cristãos casarem com mulheres muçulmanas porque na sua cultura as mulheres não têm poder nenhum sobre os homens?
São demasiadas perguntas. Perguntas cujas respostas não estão no discurso deste Cardeal.
É também feita uma generalização. Por certo, nem todos os homens muçulmanos são assim. O bem e o mal estão retratados em tudo, e de certeza que há homens muçulmanos que são bons e que nunca seriam capazes de oprimir as mulheres. Muito menos, oprimi-las pelo simples facto de serem mulheres.
Existe também uma discriminação. Está subjacente em todo este discurso. Basta reparar que o que o Cardeal está a dizer é simplesmente para as mulheres cristãs casarem com homens cristãos e para não se “misturarem” com outras religiões. Quase que dá a ideia que o Cardeal acha a sua religião melhor que a outra por causa disto e daquilo. Uma religião que tem tantos problemas como todas as outras.
Concluindo, acho que esta discriminação não devia ser feita por uma figura que está numa posição alta na hierarquia da Igreja – como a que foi feita pelo Papa quando disse que se deve salvar a Humanidade da Homossexualidade. Só alimenta os preconceitos e as discriminações já existentes. Aliás, ninguém devia discriminar os outros por serem diferentes. E se a mulher cristã e o homem muçulmano se casarem pelos motivos certos, não vejo qualquer problema nesse casamento. Nem neste nem noutro casamento em que as religiões não sejam iguais.

Ana Rita