domingo, 23 de novembro de 2008

Uma leitura de Medeia, de Eurípides


O livro que li foi a recriação poética da tragédia de Eurípides, Medeia, de Sophia de Mello Breyner. Sophia de Mello Breyner já tinha feito outras recriações de obras gregas, como, por exemplo, da Odisseia, de Homero.
Toda a acção decorre em Corinto, onde o rei é Creonte. Medeia era casada com Jasão e, juntos, tiveram filhos. A Ama chamava a Jasão, o “Tosão de Oiro”. Medeia era cega e possuída pelo amor de Jasão. Ela procurou sempre que todos a amassem e tentara sempre a concordância de Jasão. A Ama dizia que só existe paz quando uma mulher se submete.
Mesmo assim, Medeia foi magoada. Jasão traíra-a, a ela e aos filhos. Traiu-a com a filha de Creonte, rei do país. Perante esta situação, Medeia invocou juramento, implorando os deuses como testemunhas. Medeia volta-se, então, para a sua dor, para o seu sofrimento. A partir daqui, Medeia sente desencadear dentro de si uma confusão de sentimentos, uma mistura de ódio e amor.
Passava os seus dias envolta em dor e em choro, de rosto baixo, olhos baixos, por vezes imóvel. Outras vezes erguia-se a falar de si própria.
Lembrando-se que tinha deixado a sua pátria, a casa, o pai, para seguir Jasão, que agora a traíra, sentia-se injustiçada. A sua dor ensinara-lhe o quanto ganha quem é fiel à sua terra. Começa a afastar os seus filhos bruscamente, como se depositasse também neles o seu ódio por Jasão.
O preceptor velho, mestre dos filhos de Jasão, informa este acerca do sofrimento de Medeia, dizendo-lhe que ainda estaria a começar. Com efeito, Medeia ainda não soubera da última desgraça: iria ser expulsa, juntamente com os seus filhos, de Corinto, a mando do rei.
Como é óbvio, Jasão permiti-lo-ia, porque a aliança recente valia mais do que a aliança do passado. Tentam consciencializar as crianças acerca do seu pai. Medeia, com este sofrimento todo, diz que os filhos deveriam morrer com o pai e a casa afundar-se-á.
Medeia entra em profunda fúria. Antes de sair da cidade, revela a Creonte o que quer fazer: matar a sua filha, bem como os seus próprios filhos, e devastar a casa de Jasão.
Creonte tenta consciencializá-la, dizendo que não vai contra a lei humana de matar, e matar o fruto do próprio ventre.
Um mensageiro anuncia que morreu a mulher de Jasão, bem como o seu pai. Mesmo assim, Medeia quer matar os seus filhos.
Medeia é uma tragédia. A tragédia é uma forma do género dramático, que se caracteriza pela seriedade e dignidade, frequentemente envolvendo um conflito entre uma personagem e algum poder ou instância maior, como a lei, os deuses, o destino ou a sociedade. As origens da tragédia são desconhecidas, mas terá nascido certamente na Grécia Antiga.
Aristóteles dizia que o que caracterizava a tragédia grega era o facto de despertar, no público o “terror e a piedade”. Afirma que as partes da tragédia constituem-se de passagens em versos, recitados e contados, e aí actuam as personagens directamente, não havendo relato indirecto. A sua função é provocar, por meio de paixão e do terror, a purificação dos sentimentos.
Segundo Aristóteles, deve ainda obedecer a três condições: possuir personagens de elevada condição (heróis, reis, deuses); dever ser contada em linguagem elevada e digna de ter um final triste, com a destruição ou loucura de um ou vários personagens sacrificados pelo seu orgulho.
Os autores clássicos referem-se à tragédia grega como o mais nobre dos géneros literários. Além dos actores, na tragédia grega intervinha também o coro, que manifestava a voz do bom senso, da harmonia e da moderação em confronto com a exaltação dos protagonistas.
Do ponto de vista temático, a tragédia apresenta um herói que, desafiando propositada ou involuntariamente as leis dos deuses, é por estes castigado.
Os três grandes tragediógrafos da literatura grega são Sófocles, Eurípides e Esquilo.
Em Medeia, encontramos algumas marcas, alguns elementos essenciais, da tragédia grega.
A "hybris" é um desses elementos, que é o sentimento que conduz o herói da tragédia à violação da ordem estabelecida, através de uma acção ou comportamento, que se assume como um desafio aos poderes instituídos (leis dos deuses, leis das cidades, das famílias e da natureza).
Por exemplo, Jasão traiu Medeia, logo, vai contra a lei da família. Medeia abandonou a sua terra, pelo seu amor, logo, vai contra a lei da cidade.
Outro elemento é o "pathos", que é o sofrimento progressivo do protagonista, imposto pelo destino. Nesta tragédia, vemos que Medeia tem um sentimento em progresso.
Medeia era uma mulher carregada de amor e ódio a um só tempo. Era uma esposa repudiada e estrangeira. Assume uma posição de fúria terrível, acabando por matar os seus filhos para que estes não vão com o marido, deste modo vingando-se.

Mariana Cruz

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