quarta-feira, 24 de setembro de 2008

«Linguagem Universal» de M. S. Lourenço


O título deste excerto, retirado de Os Degraus do Parnaso, de M.S. Lourenço, é «Linguagem Universal». A partir de uma apresentação geral do texto e da nomeação dos seus conteúdos fundamentais, consigo seguir para uma mais profunda compreensão da obra do autor. Este texto contém vários sub-temas que rodam em torno de uma ideia fundamental e que, de certa forma, se interligam uns após os outros.
O escritor, ao longo do texto, mostra o seu conhecimento acerca do tema tratado, não deixando de opinar e de expor certos pontos de vista acerca da Literatura e da relação desta com os mais variados assuntos.

A ideia primordial que retiro deste texto é a existência de dois mundos distintos: um mundo exterior, objectivo e palpável; e um mundo interior, não mensurável, mas espiritual. Apesar das distintas características de cada um deles, o próprio homem encontra-se sempre na fronteira entre um e o outro. Para além de viver num mundo que vê e que se lhe apresenta como concreto, tem conhecimento do mundo inexprimível que também lhe pertence. É vulgar que em muitas situações o homem se sinta obrigado a passar para um dos mundos, não encontrando a complementaridade entre os dois.
A ciência estuda uma realidade objectiva, que a humanidade conhece e que é o mundo exterior. É nesta realidade que a pessoa vive uma parte das suas experiências.
Por outro lado, existe um mundo que corre dentro de si, o furor dos sentimentos, as memórias, as angústias. Este só pode ser “estudado” ou compreendido quando a própria pessoa deixa uma abertura por onde escapam os seus sentidos, o seu interior. O homem detém laços com cada uma das suas partes e não há força que o faça largar uma delas.
O escritor vive uma experiência transcendente, tão marcante que acaba por moldá-lo.
A “percepção da realidade sensível e a intuição da realidade inexprimível” só é possível através da experiência transcendente. Por isso, a obra está sempre baseada na experiência própria, sendo, por isso, um texto autobiográfico. É através da obra literária que o artista faz a ligação destes dois universos.
A Literatura serve, então, como uma Linguagem Universal, na medida em que une dois mundos distintos do próprio Homem e os torna compreensíveis em conjunto.

O artista literário


Agora, falando concretamente do sujeito criador da arte literária, podemos enumerar certas características que lhe pertencem.
O artista verdadeiro é aquele que alcançou sensibilidade para perceber as duas realidades, graças a um “Sopro Divino”, que lhe rodeia o espírito. É este Sopro, este Dom, que lhe confere a confiança de que o que está a fazer está bem feito. Cada pessoa faz uma interpretação desta Graça, pois cada pessoa é tocada de uma maneira particular e única.
O artista verdadeiro é aquele que já viveu uma experiência para além do real e é através desta que, simbolicamente, transfere o que viveu para o papel. O escritor precisa de apoiar e validar a sua obra com uma experiência própria, com um episódio que conhece, com uma lição que aprendeu. A descrição de um momento em concreto da vida do escritor torna-se a prova viva do conhecimento que ele detém.
Sendo assim, o artista possui conhecimento verdadeiro, já que o que descreve são objectos concretos e reais de que o artista tem plena consciência da sua existência (não são frutos da sua imaginação).
M.S. Lourenço tenta explicar que o conhecimento é também uma realidade objectiva, já que o artista parte de dados reais e não apenas de ideias mentais.
Esta reflexão ajuda-nos a perceber o sentido da frase “O artista literário rejeita assim a esquizóide parafernália da concepção idealista da representação da realidade por meio de imagens mentais, e a consequente degradação do conhecimento a uma experiência irredutivelmente subjectiva”.

Literatura e Conhecimento

Relativamente à Literatura, posso afirmar desde já que só se pode “fazer” Literatura se se detiver o conhecimento acerca do que se vai escrever. Esta não é como uma ciência, não exige respostas únicas e certas, como acontece com a Física e com a Matemática. O artista deve acreditar na verdade do conhecimento que alcançou, já que a determinação e o trabalho justificam a falta de certezas absolutas; caso contrário, o cepticismo – sendo um obstáculo à actividade criadora – acaba por vencer o artista. O artista não se deve deixar levar por dúvidas e deve envolver-se no que constrói, consciente da sua Verdade.
A Literatura estuda a “vida interior”: aquilo que o escritor vive reflecte-se na sua escrita, mesmo que muitas vezes não tenha essa consciência. A esta disciplina está bastante ligada a psicologia.
O artista, na sua escrita, utiliza uma Linguagem Universal, capaz de responder às exigências do mundo palpável e do mundo interior, devido ao conhecimento que tem vindo a deter através das experiências.

A Literatura sendo autobiográfica


A obra literária é sempre baseada em qualquer coisa pessoal - desde um momento particular até a uma simples reflexão por nós realizada - mesmo que o leitor nem sempre se aperceba. A criação é sempre um espelho do interior com a armação da realidade exterior, daí a ser tão fundamental a crença no que se produz.
O valor do artista está de certa forma revelado no seu método autobiográfico e na forma como ele encaixa os vários momentos, objectos, movimentos, tudo o que regista.
Podem existir textos mais autobiográficos do que outros. Nesse caso, apenas existe uma diferença na intensidade desse mesmo tom autobiográfico, não deixando o texto de o ser.
Tudo o que escrevemos tem um pouco do seu autor e a escrita é uma maneira de se conhecer a personalidade artística.

Literatura e Ciências


Quer a Literatura quer a Ciência giram numa órbita em busca da Verdade acerca das coisas de que se ocupam, embora tenham métodos diferentes.
Enquanto que na literatura o uso de sentimentos e da intuição pode ser válido e crucial, nas ciências nada deve constar para além dos factos realmente provados – já que a intuição não é fiável e o próprio homem é inconstante. É por esta razão que o Homem sempre se apoiou nas ciências: estas são matérias que lhe dão as seguranças e as certezas que nunca consegue alcançar. Somos chamados a juntar o raciocínio lógico e a intuição como duas categorias psíquicas essenciais para a busca de conhecimento.
Com a utilização da intuição somos capazes de interpretar textos que contenham expressões simbólicas, atribuindo-lhes um sentido pessoal.
Marta Serra, nº21 11ºD

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