terça-feira, 23 de setembro de 2008

Maria Filomena Mónica, «Os Ricos e os Pobres», in Vida Moderna, Quetzal Editores, 1997, pp. 196-198.

No último século, Portugal mudou para além do que se julgava possível. Tanto, que nem nos lembramos já do imobilismo, do isolamento e da rigidez social daquela sociedade. Hoje, qualquer português pode escolher o partido em que votar, reunir-se com quem lhe apetecer, rezar ao Deus que entender, falar sobre o que quiser e ter acesso a uma justiça livre de pressões políticas.
Entre os ricos, na sociedade portuguesa, distinguiam-se os velhos ricos e os novos-ricos. Os velhos ricos eram pacatos, com uma forma de estar reservada, não querendo muitas atenções sobre si. Pelo contrário, os novos-ricos queriam fama, festas e todas as atenções possíveis sobre si próprios.
A partir de 1926 tudo mudou com o regime salazarista, regime que era ainda mais reservado do que os próprios velhos ricos.
Durante o regime salazarista as exibições e os espectáculos promovidos pelos portugueses ricos eram inexistentes, o país era demasiado pobre, ninguém se destacava.
A partir dos anos 60, Portugal atravessou outra fase, já com a introdução da televisão, com a evolução da emigração e com um novo arranque económico. Uma fase de explosiva abastança, onde valia tudo para se distinguir. Os novos-ricos aproveitaram este salto e voltaram, então, a fazer das suas. Com o 25 de Abril e o fim do regime salazarista esta transformação acelerou-se. Os novos-ricos estavam deliciados, tinham finalmente a oportunidade de mostrarem o que é que valiam, e, para grande felicidade deles apareceu a imprensa mundana. Passou a existir uma balança para pesar os diferentes níveis sociais.
É obvio que o aparecimento da imprensa desagradou, e bastante os velhos ricos que odiavam ver a sua vida ser comentada.
Em Portugal, ainda se passou outro fenómeno muito interessante. Os portugueses consideravam que os pobres eram pobres, não por culpa de alguém, mas sim porque o tinham sido desde de sempre. Não tinham hipótese de subir. Mesmo que fizessem igual ou melhor do que os ricos, eram estes que ocupavam os cargos devido à influência do nome da família.
Os poucos que conseguiam ir trepando na escala social, envergonhavam-se a certa altura sobre as suas origens e calavam-se, abrindo um caminho sem obstáculos em direcção ao topo, aos que não tinham vergonha de afirmarem quem eram e que ideais tinham, quer fossem correctos ou errados.
O mérito não servia de nada, é a conclusão que se pode tirar em relação à escala social de Portugal nestas últimas décadas.
Diogo Santos

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